fim de ano, começo de ano
Tem uma hora na vida em que a evidência te alcança, você lamenta, mas se despede. Ah, e é claro, perde o pudor diante da calamidade da própria insistência. Nunca acho fácil jogar qualquer coisa fora: papéis, diários arcaicos, jornais antigos, ídolos, vidros vazios de alfazema. Com o Fernando Henrique meu caso é mais grave por que entre as promessas que mais levo a sério na vida estão os livros. Mas ele, o presidente-professor, não sabe o que é uma utopia negativa ou não sabe o que se faz com uma. E claro, é vaidoso em demasia. Pois bem, a aula de despedida:
A alienação de FHC, por Luis Nassif, 24/12/2006
A entrevista de Fernando Henrique Cardoso na “Folha” mostra que o ex-presidente ainda não se antenou para os novos ventos políticos, no Brasil e no mundo.Aliás, não se antenou em 1994. Com inúmeros novos valores fundamentais surgindo –a questão da gestão, as novas ferramentas de política social, as estratégias de colocação dos países na nova economia global, o novo modelo de Estado – sua visão de mundo continua se resumindo aos meios, jamais aos fins, com uma superficialidade acachapante. Como fez durante todo seu governo, limita-se a levantar bandeiras soltas (privatização, reforma do Estado) sem nenhum plano estratégico por trás. Sua opção pela liberalização financeira, ao invés da liberalização comercial, foi o maior erro estratégico que o país cometeu na sua história moderna. Seu descuido em relação à absorção de tecnologia do estrangeiro, ao controle das formas modernas de produção (como fez a China, com seu programa de atração de empresas, não de capitais) jogou fora a grande oportunidade aberta pela implosão da cadeia produtiva das multinacionais. A oção pela liberalização financeira provocou apreciação do câmbio, desestruturação do aparelho produtivo, concentração de renda, aumento da carga tributária, desestímulo ao empreendedorismo, esmagamento da classe média e criação de uma dívida interna que levará anos e anos ainda para ser debelada. Abandonou planos de reforma administrativa, a chance de mudar a Previdência com a privatização. E vem falar que falta agenda ao governo Lula? Falta agenda ao país há doze anos.Mas esqueça-se o passado, e vamos olhar para frente. Na mesma edição da “Folha” tem o artigo “O auge da globalização já passou?”, de Rawi ABdelal e Adam Segal, publicada no "Foreign Affairs". Os autores deixam claro que, com a decepção trazida pela liberalização financeira dos mercados, os novos valores que começam a se impor são o do controle gradativo dos fluxos de capitais e a atenção à inclusão social.Em sua longa entrevista, FHC continua agarrado aos meios (privatização e redução do tamanho do Estado) esquecendo-se dos fins. Não toca em nenhum momento na questão da liberalização financeira, como se fosse um dado imutável da realidade, aceito universalmente sem nenhuma espécie de questionamento, não consegue enxergar a gestão como elemento fundamental de reforma de Estado, passa ao largo da inclusão social, como elemento estruturante de qualquer política econômica legítima.Aliás, é chocante a diferença de dimensão entre sua visão estereotipada de reforma do Estado, e o que foi exposto na “Folha” de sexta por Antonio Anastasia, Secretário do Planejamento de Minas.Em outras entrevistas, sustentou que o PSDB precisa reconquistar a Academia. De que maneira? Qual a idéia legitimadora? Qual a estratégia mobilizadora: a defesa do seu governo? Com exceção de Boris Fausto e meia dúzia de professores tucanos, que intelectual endossaria uma proposta tão vazia assim? Em seu governo, a idéia do crescimento com inclusão social passou encilhada, e ele não montou, deixou de bandeja para Lula. Agora, pretende reconquistar corações e mente em cima de valores que ele próprio desmoralizou com sua falta de visão estratégica?Diz que o PSDB deve se apresentar como o partido dos contribuintes e dos empreendedores. Mostra não ter assimilado ainda o aparecimento da nova massa de cidadãos, ou pelo menos abdicado de disputá-los com Lula. Mas quem matou a classe média, por excesso de impostos, e o empreendedorismo, por falta de câmbio, excesso de juros e nenhuma vontade de melhorar o ambiente econômico, deixando tudo por conta da liberalização financeira e da privatização?Repito o que já escrevi algumas vezes. O PSDB precisa se refundar. Mas o passo inicial é exorcizar o ectoplasma de FHC. É a âncora que o mantém amarrado a um passado estéril, anacrônico, falsamente moderno, e que o afastou da classe média, que era sua base, e não lhe abriu espaço junto ao novo eleitor que surgiu.
A alienação de FHC, por Luis Nassif, 24/12/2006
A entrevista de Fernando Henrique Cardoso na “Folha” mostra que o ex-presidente ainda não se antenou para os novos ventos políticos, no Brasil e no mundo.Aliás, não se antenou em 1994. Com inúmeros novos valores fundamentais surgindo –a questão da gestão, as novas ferramentas de política social, as estratégias de colocação dos países na nova economia global, o novo modelo de Estado – sua visão de mundo continua se resumindo aos meios, jamais aos fins, com uma superficialidade acachapante. Como fez durante todo seu governo, limita-se a levantar bandeiras soltas (privatização, reforma do Estado) sem nenhum plano estratégico por trás. Sua opção pela liberalização financeira, ao invés da liberalização comercial, foi o maior erro estratégico que o país cometeu na sua história moderna. Seu descuido em relação à absorção de tecnologia do estrangeiro, ao controle das formas modernas de produção (como fez a China, com seu programa de atração de empresas, não de capitais) jogou fora a grande oportunidade aberta pela implosão da cadeia produtiva das multinacionais. A oção pela liberalização financeira provocou apreciação do câmbio, desestruturação do aparelho produtivo, concentração de renda, aumento da carga tributária, desestímulo ao empreendedorismo, esmagamento da classe média e criação de uma dívida interna que levará anos e anos ainda para ser debelada. Abandonou planos de reforma administrativa, a chance de mudar a Previdência com a privatização. E vem falar que falta agenda ao governo Lula? Falta agenda ao país há doze anos.Mas esqueça-se o passado, e vamos olhar para frente. Na mesma edição da “Folha” tem o artigo “O auge da globalização já passou?”, de Rawi ABdelal e Adam Segal, publicada no "Foreign Affairs". Os autores deixam claro que, com a decepção trazida pela liberalização financeira dos mercados, os novos valores que começam a se impor são o do controle gradativo dos fluxos de capitais e a atenção à inclusão social.Em sua longa entrevista, FHC continua agarrado aos meios (privatização e redução do tamanho do Estado) esquecendo-se dos fins. Não toca em nenhum momento na questão da liberalização financeira, como se fosse um dado imutável da realidade, aceito universalmente sem nenhuma espécie de questionamento, não consegue enxergar a gestão como elemento fundamental de reforma de Estado, passa ao largo da inclusão social, como elemento estruturante de qualquer política econômica legítima.Aliás, é chocante a diferença de dimensão entre sua visão estereotipada de reforma do Estado, e o que foi exposto na “Folha” de sexta por Antonio Anastasia, Secretário do Planejamento de Minas.Em outras entrevistas, sustentou que o PSDB precisa reconquistar a Academia. De que maneira? Qual a idéia legitimadora? Qual a estratégia mobilizadora: a defesa do seu governo? Com exceção de Boris Fausto e meia dúzia de professores tucanos, que intelectual endossaria uma proposta tão vazia assim? Em seu governo, a idéia do crescimento com inclusão social passou encilhada, e ele não montou, deixou de bandeja para Lula. Agora, pretende reconquistar corações e mente em cima de valores que ele próprio desmoralizou com sua falta de visão estratégica?Diz que o PSDB deve se apresentar como o partido dos contribuintes e dos empreendedores. Mostra não ter assimilado ainda o aparecimento da nova massa de cidadãos, ou pelo menos abdicado de disputá-los com Lula. Mas quem matou a classe média, por excesso de impostos, e o empreendedorismo, por falta de câmbio, excesso de juros e nenhuma vontade de melhorar o ambiente econômico, deixando tudo por conta da liberalização financeira e da privatização?Repito o que já escrevi algumas vezes. O PSDB precisa se refundar. Mas o passo inicial é exorcizar o ectoplasma de FHC. É a âncora que o mantém amarrado a um passado estéril, anacrônico, falsamente moderno, e que o afastou da classe média, que era sua base, e não lhe abriu espaço junto ao novo eleitor que surgiu.
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