paisagens de despedida em versões de músicas

não gosto de ouvir certos discos porque ainda não passou a saudade das vozes congeladas neles. havia muito tempo que não tirava o cd da cássia eller da estante, mas hoje me deu muita vontade de ouvir... renato russo, e não me demorei a me lembrar que ela é a voz dele e do quanto eu gosto disso. tenho amigos que reclamam a todo tempo da década de 1980, da bobagem em luz de neon que vivemos, da trivialidade pós-moderna e e festiva da escola de arquitetura, que claro, assim como a década, envelheceu impiedosamente. era uma euforia e como tal, terminou - graças a deus - porque as febres sempre arrefecem. também era verdade que abríamos caminho a canivete, pois ninguém naquela escola estava de fato preocupado em esclarecer coisas e pensamentos para os estudantes. salvo honrosas exceções, entre os professores (arquitetos ou não). isso somado à nossa doença de enformar o mundo (todo o mundo!) não daria em coisa muito diferente: só restava a quem estudava arquitetura viver feliz, um tanto às cegas, mas sempre na superfície. sem se deixar afogar em mergulhos escuros. e sem enfrentar qualquer coisa que durasse mais de cinco minutos, em maiores profundidades que meio metro. vejo muito meus amigos da década de oitenta, agora já nem tão amigos assim, mas gosto de observá-los envelhecer, como eu. me lembro do quanto eram felizes, e eu não.
eu lia coisas sombrias, fazia raciocínios incompletos e pensava coisas muito angustiantes. mas eu tinha dois remédios. nadava no fim da tarde na piscina coberta do minas dois, 38 minutos, e ouvia muito legião urbana. é uma heresia, eu sei, mas era melhor que shakespeare. e a minha era uma outra década de 1980. não lamento o término daquele tempo, os anos noventa com sua queda na realidade me fizeram bem demais, pude ser infeliz e atormentada à vontade. nem minha mãe implicava mais comigo. mas eu devo muito àqueles dias em que aprendíamos a olhar o mundo desde a perspectiva da rua paraíba. e - invariavelmente - à distância me sinto mais próxima de alguns amigos de quem agora posso gostar sem receio, agora que a tristeza cabe em suas vidas, desobrigados que estão da juventude. eu e eles temos muita saudade das horas mortas daquela escola.