não há nada lá dentro, pode entrar.

hoje tirei o dia para me livrar da burocracia - eu me iludo facilmente, é assim que suporto a estupidez -; ontem fui dormir com o firme propósito de acordar de madrugada, preencher listas de frequência no site da universidade, mandar os mails dos alunos, corrigir os trabalhos que ainda estavam online e eu precisava baixar urgentemente, agendar as aulas da noite para completar a carga horária das semanas em que fiquei afogada terminando a tese, preencher o cadastro do ministério da educação, preparar para participar da banca de avaliação dos trabalhos de conclusão de curso. que parte disso deu certo?ora, são 7:56 da manhã, então, pelo menos meu plano de ocupar minha madrugada funcionou. acordei como um relógio, 4:22, todo dia é assim. adoro respirar o último ar da madrugada, o primeiro do meu dia desperto. é o único momento gelado do dia. até faço um pouco de hora pra sair da cama , do meu quarto sem cortinas fico espreitando da janela o dia clarear, mas me levanto; quase todo meu combustível pra escrever vem dessa hora: aqui por perto de casa tem um monte de galos, a rua é silenciosa, o primeiro onibus que escuto passa às 5:10 - o motorista respeita como um relógio a escala de horários - às 5:30 meu vizinho do prédio à esquerda sai da garagem, faço café, leio trechos de um dos livros na minha cabeceira, duas frases, que sejam, mas sempre as acho decisivas.
hoje, contudo, violei meu horário nobre. em vez dos meus cadernos, do cheiro dos lápis apontados, da vagareza da minha escrita esperando ficar de manhã, a burocracia universitária. juro que me esforcei, mas foi só isso: um esforço que, no fim, dá em impotência. são pilhas de papel, sites que não funcionam, funcionários em três instituições, gente que precisa se ocupar muito em fazer muito corretamente as tarefas, todas formais. o discurso, o trato, as pesquisas inexistentes, os consumidores-alunos, a eficiência administrativa, reuniões - coisa que fazem o tempo escoar, oco. dispersão é o outro nome da universidade brasileira. não, isso é injusto. dispersão é o outro nome da vida brasileira: acumule 327 coisas no seu dia, e desempenhe de modo excelente aquela que está na superfície. comprometa-se com avaliações institucionais, modelos (templates e os de carne e osso), formas, formulários, censuras disfarçadas, cremes anti-rugas, gerúndios, definições sobre tudo retiradas das manchetes do péssimo jornal matutino, ostentosas festas de aniversário de criança, emoções que duram duas linhas , cinco minutos e têm dois centímetros de profundidade (e os clichês, as frases de feito, como essa mesmo - eu sei de cor porque a repito sempre, um mantra). tédio nenhum me alimenta. preciso esvaziar a minha vida disso.

Comments

OCSB said…
Vem cá, não tenha medo
A água é potável
Daqui você pode beber
Só não se perca ao entrar
No meu infinito particular
(eu e marisa monte)
O que dizer? Pleno, absoluto e total apoio aos protestos! Muito bonito esse acordar no mais frio da manha e ve-la aurora. Bjaum!
OCSB said…
vc está escrevendo muito lindo.
o blog vem mudando de cor...
OCSB said…
marisa monte - infinito particular - track 08 gerânio.
aliás, o que vc cozinha bem?
cozinho legumes no vapor, com receitas que tem "mistério, mas não segredos."
OCSB said…
cadê o post que eu coloquei aqui?
OCSB said…
amanhã, menos hipnotizado, coloco de novo. adoro legumes com mistério.

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